Rui Vitória em entrevista ao Expresso
Entrevista de Rui Vitória ao Expresso.
Disse numa entrevista que soube que ia para o Benfica quando recebeu um telefonema de Luís Filipe Vieira. Onde estava na altura?
Estava com a minha mulher e com as minhas filhas. Primeiro, pensei: “O que é que se passa aqui?” Mas foi como mera curiosidade, e depois eu e o presidente continuámos a falar. E só a partir daí é que percebi o que estava em causa naquele telefonema.
O que sentiu?
Nada. Foi do género: “Espera lá, que está aqui um convite do Benfica… Se calhar, é a sério.” Às vezes, imaginamos estas coisas.
Acreditou naquilo que lhe estava a acontecer?
Acreditei, porque conheço o Luís Filipe Vieira, e quando ele falou comigo percebi logo que era uma coisa muito séria.
Qual foi a primeira pessoa a quem contou? Depois da sua mulher, obviamente.
Ficámos ali os dois a pensar, porque não queríamos divulgar o que quer que fosse. Só depois é que comecei a falar com os meus dois adjuntos, quando as coisas já estavam fechadas com o Benfica. É que eu sou muito assim, mantenho o segredo. E, se a minha mulher não estivesse ali ao lado na altura do telefonema, nem ela teria sabido.
Fala de futebol com a família?
Não é muito meu hábito. Temos de proteger quem está connosco. O futebol é um mundo à parte, e quem está de fora não percebe que o treinador e o jogador sentem e fazem coisas diferentes dos outros, com algumas regras que diferem. Por isso, gosto muito de me reservar.
Em sua casa há muitas coisas relacionadas com futebol?
Não… Tenho três filhas, e Deus queira que nenhuma delas vá para o futebol feminino.
Está-me a querer dizer que o futebol não lhe entra em casa?
É assim… Uma das minhas filhas anda muito preocupada com quem entra e sai do Benfica. Ela não sabe bem quem é quem, mas pergunta: “Então mas este sai daqui ou quê?” Mas tento que a minha vida pessoal fique bem separada da profissional.
Toda a gente sabe que é benfiquista, mas passava-lhe pela cabeça um dia treinar o Benfica?
Sempre quis subir na vida, na carreira, mas nunca vi as coisas dessa forma. As coisas foram conquistadas ano a ano, mas nunca vivi de muitas ilusões. Sou muito pragmático. Cada obstáculo que aparecesse, teria de ultrapassá-lo, estabelecendo novos objetivos. Mas é óbvio que cheguei a uma altura em que pensei estar pronto para dar o salto para um clube de outras dimensões, e o Benfica é a cereja no topo do bolo. Já cá tinha estado [como treinador de juniores].
Nasceu e viveu onde?
Nasci em Alverca e vivi em Alverca durante muitos anos e só mais tarde é que me mudei para a Póvoa de Santa Iria e depois para Paços de Ferreira e Guimarães. A minha infância, juventude e o meu primeiro casamento — aconteceu tudo em Alverca. Fiz lá a escola, joguei lá muitos anos, é a minha terra. Tenho lá as minhas raízes, a minha família, os meus amigos. Tive uma infância boa, fui bom aluno até ao 12º ano, sem nunca ter chumbado e com boas notas. Só que no 12º ano, tinha eu 17 anos — estava a treinar nos juniores e a jogar nos seniores do Alverca —, decidi armar-me em futebolista: “Se não fizer este ano, e tal, também não faz mal, porque tenho 17 anos.” O que aconteceu? Chumbei. É o que dá armar-me em jogador de futebol [risos], armar-me em bom.
E os seus pais?
Não reagiram mal, até porque eu nunca dei trabalho, ao contrário do meu irmão, mais velho, que era bem pior do que eu. Ele hoje é uma joia de pessoa, talvez bem melhor do que eu, mas quando era miúdo… era reguila… Temos seis anos de diferença, mas ouço cada história de bradar aos céus. O meu pai, de vez em quando, chegava-lhe a roupa ao pelo. A mim, não. Quer dizer… Uma vez, sim, aconteceu uma vez.
Porquê?
Porque eu e o meu irmão andávamos à zaragata na rua e à hora de jantar estávamos a jogar futebol na rua. Lembro-me perfeitamente: o meu pai estava a chegar do trabalho, perto das oito da noite, hora sagrada para o jantar, e eu e o meu irmão estávamos ali sentados à entrada. Disse a minha mãe: “Eles hoje só andaram a fazer asneiras.” O meu pai deu uma chapada a cada um e ficou resolvido o assunto.
O que fazia o seu pai?
Era soldador, e a minha mãe era escriturária. O meu gosto pelo futebol vem do meu pai, que tinha sido guarda-redes do Alverca nos tempos antigos, e eu, desde miúdo, habituei-me a acompanhá-lo em tudo o que era bola. Lembro-me de, ao fim de semana, ir com ele ao Alverca. Começávamos de manhãzinha, voltávamos à hora de almoço a casa, e às três da tarde regressávamos. Víamos os escalões todos. Conhecia as equipas todas, juniores, seniores; e aos 9, 10 anos, quis jogar futebol e fiquei para sempre ligado a isto.
Jogava como médio?
Sim.
E o seu irmão também jogava?
Jogava pelas alas, mas, também… Quer dizer, o jeitinho dele não era muito. Lembro-me de ele chegar a casa um dia e dizer que podia ter sido um grande jogador mas que o pai lhe tinha cortado as pernas… Pois, está bem [risos]. “Ai a culpa é do pai? Está bem, está.”
E o Rui?
Eu tinha jeito, mas o jogador Rui Vitória nunca jogaria com o treinador Rui Vitória. Porquê? Porque hoje exijo coisas aos meus jogadores que eu, quando era futebolista, não cumpria. Estava a tirar o meu curso de Educação Física e havia muito aquele conceito de “primeiro os estudos, depois o futebol”. Cheguei a jogar na segunda divisão, o que não é mau. Tinha boa capacidade de leitura e gostava de organizar o jogo e até rematava bem, mas faltava-me convicção.
Era calão, não corria…
Pois. Correr, trabalhar… Eu era mais do estilo: “Passem-me a bola que eu resolvo.”
Tinha ídolos?
Rui Costa, Zidane, Platini, João Alves, basicamente todos os que eram médios centro.
Ia ver jogos à Luz?
Sim, com o meu pai, quando a vida deixava, porque naquela altura não dava para grandes aventuras. Mas lembro-me de um 5-0 ao Sporting, na Luz, em que ao intervalo o Benfica já estava com 5-0! Era o tempo do Jordão, do Laranjeira, do Botelho… Eu vivia aquilo com ansiedade como adepto. Os 40 minutos à Benfica, não era? Ou seriam os 15 minutos?
Perdeu os seus pais cedo, em 2002…
[silêncio] Foi num sábado à tarde. Estava a beber um café com uns amigos na Póvoa [de Santa Iria] e recebi um telefonema. Disseram-me que tinha acontecido uma coisa grave, e eu pus-me a caminho de Alverca, e foi só então que percebi o drama — os meus pais tinham morrido num acidente de carro. Eram três e pouco da tarde. Morreram os meus pais e os pais do meu melhor amigo [Paulo Xavier], que é padrinho da minha filha e que tem um filho do qual sou padrinho. Também jogou futebol, no Benfica. Ninguém nos prepara para isto. E ganha-se uma espécie de carapaça, nada nos pode atingir. Lembro-me de que enfrentei aquilo de peito aberto. Já era casado, tinha uma filha pequenina e tive coragem. Hoje, vejo que tive de ser forte e arranjei defesas. Fui eu que levei os meus pais para a cova, acompanhei-os até ao fim, no caixão. A partir daí, todos os problemas que enfrento são relativizados. Quando tenho de tomar decisões, lá tocam o Tico e o Teco na cabeça, que me dizem: “Olha lá, já tiveste de sofrer tanto, estás com medo do quê?” Aquilo mudou a forma como eu pensava. Tinha 32 anos.Quando seguiu para Edução Física, queria ser professor ou treinador?
Eu queria ser treinador e queria que isso acontecesse cedo na minha vida. Mas tirei o meu curso, com 24 ou 25 anos, enquanto jogava, e recordo-me de o meu treinador perguntar-me coisas do género: “Então isto é assim ou assado?” Aos 32 anos, deixei de jogar e comecei a treinar.
Foi uma mudança súbita?
Os meus pais morreram no dia 21 de setembro, e no dia seguinte já não joguei pelo Alcochetense. No domingo seguinte tive dois convites para treinar: um do Alcochetense e outro do Vilafranquense. Numa semana, a minha vida mudou completamente. Na segunda-feira à noite faço o último treino como jogador, no Alcochetense, na terceira divisão, e na terça-feira de manhã faço o meu primeiro treino como técnico, no Vilafranquense, na segunda. Imagino o que terá passado pela cabeça dos tipos do Vilafranquense quando me viram a treiná-los — eu que, há dias, era médio num clube de uma divisão inferior. E já tinha sido capitão de equipa do Vilafranquense [risos].
E os presidentes dos clubes não levantaram problemas?
Levantaram… No domingo à noite recebi dois telefonemas: um para treinar em Alcochete, outro para treinar em Vila Franca. Quem me contactou primeiro foi o Vilafranquense, às nove da noite; 30 minutos depois liga-me o Alcochetense. Eu decidi-me pelo Vilafranquense porque me ligou primeiro, porque fora jogador lá durante anos e porque… estava na segunda divisão. Tive de marcar a minha posição, fiz finca-pé.
E como foi a primeira experiência a treinar?
Foi um estágio para o que ia apanhar na vida [risos]. Em dois anos, somámos nove meses de salários em atraso, quatro ou cinco na primeira época, quatro ou cinco na segunda. A malta ganhava pouquíssimo, eu levava mil euros (tinha a sorte de também ser professor), mas havia quem não pudesse ir treinar porque não tinha dinheiro para o gasóleo ou porque tinha contas para pagar. Eu, como jogador, nunca tivera um salário em atraso, nem no Vilafranquense. Isto obrigou-me a puxar pela cabeça constantemente, porque tinha de estar do lado da direção um dia e do lado dos jogadores no outro. Tudo com muitas pinças. Mas nós corríamos e trabalhávamos muito e marcámos 140 golos, acho, no primeiro ano; no segundo, houve uma redução orçamental drástica — está visto que estou fadado para isto, para projetos difíceis [no Vitória de Guimarães, Rui Vitória teve de lidar com salários em atraso]. Acabado esse ano apareceram-me duas ou três oportunidades para treinar na segunda divisão, na região de Lisboa. E, então, o Benfica convidou-me para ir para os juniores, mas eu não queria ser rotulado como treinador de jovens. Repensei. “Às tantas, isto é importante para a tua carreira, para perceberes os jovens e conheceres a realidade de um clube grande.” Cumpri dois anos, e no primeiro deles estivemos a 15 minutos de sermos campeões, num jogo contra o Sporting de Paulo Bento, em que houve umas decisões de arbitragem de que, enfim, não vale a pena falar agora. No ano seguinte, as coisas não correram tão bem, e eu decidi — e o Benfica também — que era altura de partir. Sem clube em vista.
Não foi arriscado?
Foi, sim, mas felizmente, na semana seguinte, recebi um convite do Fátima. Foi uma coisa de dias, e levei o Arnaldo [Teixeira, o adjunto] comigo pela primeira vez. Achei que ele tinha o perfil ideal para ser o meu braço-direito, porque já o conhecia da escola onde dava aulas. Cheguei ao Fátima, que fora segundo classificado na II B com o Paulo Torres, e pensei: “Eh, pá, estes agora querem que eu seja primeiro…”
Houve redução orçamental?
[risos] Houve, claro. É a minha sina. Mas fomos campeões e subimos de divisão, à II Liga. É um percurso de quatro anos que fica marcado por aquela eliminatória com o FC Porto, na Taça da Liga, que passámos. E perdemos com o Sporting por causa dos golos marcados fora. Tenho cá para mim que, se tivéssemos passado, a Taça da Liga tinha acabado naquele ano [risos], sem Benfica, FC Porto e Sporting. Foi nessa altura que me armei um bocadinho em treinador, e explico porquê: pedimos umas credenciais para espiar o FC Porto num jogo internacional; um ficou com o processo ofensivo, outro com o defensivo, e eu com o plano geral, armado em catedrático da coisa… Mas acabámos por eliminar o FC Porto com base nos apontamentos que tirámos.O seu telefone tocou depois disso?
Aquilo criou curiosidade às pessoas, e dei algumas entrevistas, porque teve impacto. Eliminando o FC Porto e batendo o pé ao Sporting, tornei-me conhecido.
No Fátima, o presidente era o padre António Pereira…
Isso é giríssimo, não é?
Confessou-se com ele?
Não, não, nunca. Sou católico, mas não pratico. Mas lembro-me de que ele tinha este discurso: “O que é preciso é que ninguém se aleije, que haja saúde.” Estávamos ali nós, naquela de ir para o jogo, com o discurso agressivo, e vinha o padre e dizia aquilo [risos].
E é supersticioso?
Sou e não sou. Tenho rituais de conforto.
Tais como?
Eu sei lá [silêncio]. Olhe, entrar com o pé direito, usar a mesma roupa da semana passada, em que ganhei. Mas recordo-me daquela eliminatória com o FC Porto para a Taça da Liga em que disse para o meu adjunto: “Arnaldo, quando formos para os penáltis, viro-me de costas para o campo. Já sei que, se ganharmos, isto vai ser notícia.” E correu bem. A partir daí, passei a pôr-me de costas para o relvado nos penáltis. São pancadas que nós temos.
De Fátima foi para o Paços, onde chegou à final da Taça da Liga, e do Paços seguiu para Guimarães. E, no primeiro treino, os adeptos invadem-lhe o campo…
Vou dizer-lhe isto do fundo do coração. Quando vi a invasão, pensei: “Era mesmo disto que eu precisava. Estou num clube grande.” Depois do treino, tinha o telemóvel cheio de mensagens e chamadas, com as pessoas preocupadas com aquilo, pensavam que eu tinha levado uma trepa. Mas foi estranho, porque eu ia atrás dos jogadores, no túnel, para o treino, e ouço alguns deles: “Ó mister, já estão ali a bater no Faouzi [futebolista].” Estava eu a querer entrar no campo e eles a voltarem para trás, porque andava tudo engalfinhado, adeptos com futebolistas. A partir daí, os treinos foram sempre à porta fechada. Eu ouvia muitas histórias de antigos treinadores que foram apertados em Guimarães e pensava: “Isto vai tocar-me um dia.” No primeiro ano, lá está, dá-se o colapso financeiro e aparecem os salários atrasados.
Ainda assim, ganhou a Taça de Portugal ao Benfica de Jorge Jesus…
Foi um percurso difícil, mas fomos criando uma secção chamada “Secção Taça de Portugal”. Utilizávamos as mesmas metodologias e a mesma música sempre que jogávamos as eliminatórias da Taça de Portugal, que fomos passando. Eu sinto que conseguimos ganhar aquilo no dia em que eliminámos o Sporting de Braga, na meia-final, estávamos nós completamente a cair para o lado, esgotados. E chegámos ao Jamor com cinco meses de salários em atraso — os jogadores, aliás, tinham seis meses de salários em atraso.
O Benfica tinha perdido o campeonato e a Liga Europa…
Nas semanas que antecederam a final havia as duas correntes do costume: se o Benfica ganhasse o campeonato e a Liga Europa, ia relaxar no Jamor, e isso seria bom para nós; se o Benfica perdesse tudo, iria querer vingar-se no Jamor, e isso seria mau para nós. Eu preferia que o Benfica fosse derrotado, porque não acredito muito na história das vinganças; acho que uma equipa grande fica sempre mais frágil se perder grandes competições, ainda por cima consecutivas. O que eu transmiti aos meus jogadores foi isto: “Ou matamos ou morremos.” Tinha de aproveitar a fragilidade emocional e física do Benfica. “Vamos entrar com tudo.” Fiz um powerpoint com seis cenários, e num deles abordámos a derrota. Fui o mais transparente possível, porque sofrer um golo do Benfica é normal. E isso aconteceu, num ressalto do Gaitán. E pensámos: “Eh, pá, o Benfica podia ter feito um golinho de jeito, mas, assim, com a bola a bater no pé do Gaitán… Parece que nos querem mandar mais para baixo.” [risos] Ao intervalo, senti os jogadores perdidos. Disse-lhes: “Isto está dentro dos planos. Vocês sofreram um golo e não se desuniram. Continuem da mesma forma, que o Benfica pode fraquejar fisicamente.” Fomos felizes.
Um treinador tem de acreditar sempre no que diz ou está a ser um ator perante os jogadores?
Às vezes, temos de fingir.
Escreveu um livro baseado na “Arte da Guerra”. Leu-o quando?
Fui lendo durante a minha vida. Recebi um convite de uma editora e fiz um transfer do Sun Tzu para o futebol.
Já se sabe que toca bateria, mas quem é que o ensinou?
Comecei a brincar sozinho. Era miúdo, na casa dos meus pais, e as portas faziam um barulho engraçado quando eu batia nelas. E lá vinha a minha mãe: “Para com isso!” Mas eu sempre tive esse ritmo [bate com os dedos no tampo da mesa]. Aos 10, 11 anos, fui aprender bateria com o baterista dos Ferro & Fogo, o Seixas, que tinha uma grande barba e trabalhava em oficinas. Durante uns meses, fiquei ali ao lado dele; depois, deixei-me daquilo, mas sempre que via uma bateria em qualquer lado, mesmo nos estágios, havia uma coisinha dentro de mim, só que eu nunca me chegava à frente, porque era envergonhado. Recentemente, comprei uma bateria elétrica e pus-me a praticar em casa. Em Guimarães, estava sozinho [sem a mulher] e punha os auscultadores. Dava umas pauladas e não chateava ninguém.
Mas tem bandas preferidas?
Não.
E já tocou para os seus jogadores?
Já, claro. Nas festas de Natal do Vitória de Guimarães, eu tocava bateria, o Neno cantava, e um dos vice-presidentes tocava viola. Ensaiávamos duas ou três músicas e pronto. Os jogadores, na primeira vez que me viram, andaram para lá a dizer: “Então, o que é isto? O homem não está bom da cabeça!”
É um bom garfo?
Sou, sim [mexe na barriga]. Ui, como de tudo, menos, talvez, peixe frito. Gosto de cabidela, por exemplo, e lá em cima, em Guimarães, comia muito. Gosto mais de carne do que de peixe, mas costumo dizer que sou um pouco como os peixes: se me derem muito, como muito; se me derem pouco, como pouco. A minha mãe sempre me ensinou que não se deixa nada no prato!
Cerveja ou vinho?
Vinho.
É vaidoso?
Quanto baste. Não gosto que olhem para mim e pensem que estou desmazelado.
E vive 24 horas para o futebol?
Essa história de viver 24 horas para o futebol… Eu trabalho muito para o futebol, mas sei que serei melhor treinador se souber o que se passa no mundo, fora do futebol. Os clubes estão diferentes, os jogadores estão diferentes, este é um desporto globalizado. A hora e meia de treino talvez seja o menos importante. Temos de saber lidar com os jogadores, administração, o projeto do clube, o planeamento da época, etc.
O que é mais importante? O lado técnico-tático da coisa ou o lado psicológico e emocional?
Antes de mais, um jogador é um ser humano. Se conseguir entrar dentro do ser humano, consigo chegar ao jogador; se quiser começar pelo jogador, talvez não consiga chegar ao ser humano e poderei ter problemas. Os futebolistas são bem pagos, OK, mas têm pais que têm problemas, filhos que têm problemas, mulheres, namoradas… Tudo isto tem importância no rendimento deles. Não tenho de andar a coscuvilhar, mas tenho de conhecer o homem; às vezes, damos um abraço; outras, uma marretada nas costas [risos].
Tem alguma coisa a provar aos adeptos do Benfica, depois de seis anos de Jesus?
Nunca gostei de ouvir jogadores e treinadores que dizem não terem nada a provar. Isso, para mim, é sinal de comodismo. Eu tenho sempre de provar alguma coisa, há sempre alguma coisa que podemos mostrar. O passado é história.
A imagem do treinador importa?
Sim. Temos quatro áreas de intervenção. Uma é a nação benfiquista; outra são os acionistas e a administração; a terceira são os recursos humanos aqui dentro; e, por fim, há a área envolvente, saber em que tipo de clube estou, o que me pedem e o que posso dar. Tenho de estar por dentro de tudo, do lado financeiro, comunicacional, etc.
Sente-se mais do que um treinador?
Não sei se sou, mas gosto de pensar que sim.