Entrevista completa de Luís Filipe Vieira
Numa fase de mudança estratégica, o presidente do Benfica assume os riscos do novo projeto baseado no Seixal e perante algumas dificuldades anunciadas fala até em dores de crescimento. A aposta em Rui Vitória, as saídas de Jesus e Maxi, as guerras da Liga, nada escapa à análise de Vieira. Que, diz, ainda não pensou nas eleições…
FECHOU o mercado e não houve novidades do ponto de vista de aquisições ou vendas. Está confiante e otimista em relação à conquista do tri?
— Confiante e otimista, sim. Passei as últimas semanas no Seixal e sei que o plantel está motivado e vai dar tudo para conquistar o tri. Mas também sei que assumimos uma opção de mudança em relação ao que era a realidade do Benfica nas últimas décadas, e essa mudança implica tempo e também algumas dores de crescimento normais neste tipo de processos.
— Mas já se ouvem aqui e ali algumas vozes críticas em relação à opção assumida…
— É normal que assim seja. Seria igual caso tivéssemos decidido continuar a investir como no passado no mercado, fechando as portas da equipa principal aos jovens do Seixal. Vozes discordantes haverá sempre, mas fui eleito para tomar decisões e estou muito confortável com a decisão assumida. Quando se avança para uma mudança com esta dimensão, é normal que haja um período de transição, é normal que se necessite de tempo para fazer os ajustes necessários.
— A aposta na formação é por convicção, ou ditada pelas restrições financeiras?
— Claramente por convicção, ou então o Caixa Futebol Campus não faria sentido. Sou testemunha privilegiada do trabalho realizado pelos nossos treinadores das camadas jovens e do talento que desenvolvemos no Seixal. Ao contrário de outros, não fomos forçados a seguir este caminho. Chegamos a esta fase de forma planeada e desejada. Foi para chegar aqui que investimos e desenvolvemos o centro de estágio ao longo destes dez anos. O Seixal é hoje um centro de excelência na formação de jovens, e isso é reconhecido a nível internacional.
— Mas seguir este modelo, se tudo correr como deseja, significa menor investimento na compra de jogadores, ou seja, menos investimento, menos dependência de financiamento?
— Essa será uma das consequências deste modelo, e não a razão de ser desta mudança. É verdade que teremos uma redução das necessidades de investimento, uma vez que deixamos de ter um custo de aquisição, teremos uma redução do custo salarial do plantel e, finalmente, um aumento das mais valias nas vendas futuras.
— Percebo a lógica que está por detrás desta mudança, a minha questão é se não sente que é uma mudança muito rápida no paradigma do futebol do Benfica?
— Sinceramente, acho que não. Chega no tempo certo. Podemos rapidamente ver como chegámos aqui: até 2008/ 2009, vivemos um primeiro ciclo deste novo Benfica em que o nosso esforço se centrou na restituição da credibilidade interna e externa do clube, no planeamento, na construção de infraestruturas, na profissionalização do Benfica a nível dos seus recursos humanos. Depois, uma
segunda fase que eu posso situar até ao ano passado, em que se privilegiou um modelo de forte investimento em jogadores estrangeiros com experiência e forte potencial através do recurso a financiamento alheio, seja bancário ou de outro tipo, que depois amortizávamos com as mais valias das vendas. E agora, em 2015, estamos a entrar numa nova fase em que a estratégia passa por apostar em talentos gerados no Seixal. Jogadores formados dentro de casa, com baixo custo de aquisição, como disse atrás, com menor teto salarial e, não menos importante, com maior identificação com o clube. É um modelo que equilibra a competitividade desportiva com a redução do endividamento e o reforço dos capitais próprios.
— Quer dizer que o Benfica do futuro vai deixar de comprar jogadores estrangeiros?
— Não, mas vamos passar a comprar muito menos. Este modelo, e é assim que está pensado, é compatível com a continuação do investimento em jogadores estrangeiros ou portugueses de outros clubes. Provavelmente, o Benfica de agora não vai investir no Aimar ou no Saviola como fez no passado (com todo o respeito e admiração que tenho pelos dois), mas nada impede que o futuro Aimar
seja o João Carvalho ou que o futuro Saviola seja outro jovem que cresceu no nosso centro de treinos.
— Sente-se o entusiasmo quando fala do Seixal e da formação. Isso significa que o investimento no desenvolvimento do Seixal vai-se manter?
— Seguramente, mas o nível de investimento que hoje é necessário é muito menor do que foi no passado. Os benfiquistas têm de ver o Caixa Futebol Campus como um projeto de geração de valor para o clube. E, quando falo de geração de valor, não significa apenas o que vier a resultar de vendas futuras. Quando se fornecem jogadores às seleções nacionais, e é bom recordar que somos o clube que mais jovens fornece, ou quando se disputam títulos nacionais ou internacionais como a UEFA Youth League, isso significa gerar valor e reputação para o Benfica.
— A aposta na formação está refletida na equipa neste arranque de época. Acha que o Benfica pode ganhar campeonatos com quatro ou cinco jogadores da formação?
— Como foi que o Barcelona ganhou e continua a ganhar? Sim, acho possível, desde que a aposta seja consistente e continuada. E, já agora, apostar na formação não significa a necessidade de jogar obrigatoriamente com quatro ou cinco jogadores da formação na equipa titular. Mas significa dar oportunidades a estes jovens para trabalharem e crescerem junto da equipa principal, e é isso que tem vindo a ser feito.
— Está surpreendido com o desempenho do Nélson Semedo?
— Só pode estar surpreendido com o Nélson Semedo quem não acompanhou o seu percurso até aqui. Para a idade dele, é efetivamente surpreendente a postura e o à vontade que ele revela em campo. Se é um jogador feito? Não, claramente não é, mas vai crescer muito, e seguramente que, dentro de três ou quatro jogos, será um jogador muito mais confiante e muito melhor ainda do que é hoje. Mas atenção, ele, como qualquer outro jovem, tem direito ao erro, e, no momento em que errar, temos de o apoiar. não assobiar. É assim que todos eles vão crescer.
— Esta aposta é para continuar nos próximos anos, ou, se o Benfica não ganhar o tri, o projeto fica comprometido?
— A mudança de rumo que deriva da qualidade do trabalho realizado no Seixal implica naturalmente um caminho que não é isento de dificuldades. Já o sabíamos quando tomámos a decisão de implementar a nova estratégia. Os resultados irão aparecer. E espero que apareçam ainda nesta época. Independentemente do que aconteça, a aposta deve ser mantida. Ninguém disse que o caminho ia ser fácil. É preciso ter paciência para integrar os nossos jovens na equipa A, mas também é preciso assumir riscos de forma que eles possam crescer. Não temos pressa mas não podemos perder tempo.
— O Benfica tem vendido alguns jogadores da formação por €15 M. Acha que têm sido bons negócios, ou admite que há aqui um risco de venda prematura?
— Qualquer jogador de 18/19 anos que seja vendido por 15 milhões sem ter atuado na equipa principal, e num mercado como é o mercado português, tem de ser considerado um bom negócio. Disso que ninguém tenha dúvidas. Nós vendemos um talento, mas quem compra assume o risco sobre o futuro desse jogador. Sinceramente, espero que todos os jovens que vendemos nos últimos dois anos se afirmem nas suas equipas, porque isso é a melhor certificação de qualidade que podemos dar ao Seixal.
— Mas o valor de mercado de Bernardo Silva já está acima dos 15 milhões de euros…
— Ainda bem, porque isso significa o reconhecimento pelos jovens que saíram do Seixal. Percebo onde quer chegar e não quero fugir à sua pergunta: eu diria que a primeira boa geração/fornada do Seixal foi queimada do ponto de vista desportivo e salva do ponto de vista financeiro.
— Queimada por quem ou porquê?
— Não vou entrar por aí. Apenas reconheço um facto que não creio que possa repetir-se no futuro.
— O jornal francês L’Equipe escreveu que o Ivan Cavaleiro custou 3,5 milhões de euros e não 15 milhões. É falsa a notícia?
— O único comentário a fazer é que somos uma sociedade cotada em bolsa, e bastará consultar o nosso relatório e contas para poderem verificar o absurdo dessa notícia.
A CORAGEM DE RUI VITÓRIA
— Sei que disse no ano passado várias vezes que, neste ano, estariam quatro a cinco jovens da formação a trabalhar no plantel, mas esperava ver tantos jovens a jogar neste início de campeonato?
— É uma opção do Rui Vitória, que seguramente vê qualidades neles. A questão na nossa formação sempre foi a de estes jovens terem oportunidades para poderem chegar ao plantel principal. Os jovens do Seixal tinham de ter oportunidades de crescer trabalhando com a equipa A, mas jogar ou não jogar, como o Rui Vitória bem disse, são eles que têm de merecer e demonstrar que o merecem. Se têm jogado, é porque o treinador vê que têm capacidades para jogar. Já agora, deixe-me que faça aqui um desabafo: nos últimos anos, todos reclamavam porque não apostávamos nos nossos jovens. Jornalistas, comentadores e adeptos. Agora, há miúdos da formação na equipa principal, e de repente já vejo alguns benfiquistas, muitos comentadores e jornalistas a dizer que, se calhar, não vamos lá assim? É claro que vamos, mas para tudo é preciso tempo. Vamos todos ter paciência.
— Mas acha que este plantel dá garantias em relação aos desafios que vão ser exigidos?
— Dá garantias de trabalho, de empenho, de total dedicação, o que é sempre o primeiro passo para garantir o sucesso. Acho que temos um plantel sólido, que vai praticar bom futebol e que vai lutar pela conquista do tri. Se este caminho implica riscos? Claro que sim, mas não há opções sem riscos. Os outros clubes foram por caminhos diferentes, mas também assumem riscos. São diferentes, é certo. No final, espero que os benfiquistas se possam orgulhar dos resultados alcançados.
— Disse no dia da apresentação de Rui Vitória: «Há uma garantia que aqui te quero deixar vais ter as mesmas condições que outros tiveram e vais poder contar com uma equipa competitiva capaz de dar corpo às tuas/nossas expectativas.» Acha que o Rui Vitória conta com as mesmas condições que o treinador anterior?
— Assumo que gostaria de poder ter dado mais um ou dois jogadores ao Rui Vitória. Não foi possível, mas isso não significa que a equipa seja menos competitiva, ou que tenha menos soluções que no ano passado. É verdade que perdemos o Maxi e o Lima e, momentaneamente, estamos sem o Salvio, mas encontramos soluções para esses lugares, e creio que a equipa vai crescer muito a partir daqui. Prefiro uma equipa de fato-macaco, que deixe tudo em campo, a uma equipa de fato e gravata, sem compromisso.
— Que avaliação faz do trabalho de Rui Vitória até agora? O treinador já foi fortemente criticado por analistas e alguns benfiquistas porque não ganhou jogos na pré-época, perdeu a Supertaça e um jogo do campeonato…
— No Benfica é assim, passamos da euforia à depressão em muito pouco tempo, e o inverso também é verdade. A mudança que fizemos foi muito grande, e o Rui faz parte desse processo de mudança, portanto é normal que haja um período de adaptação. O Rui chegou ao Benfica pelas capacidades que demonstrou nos últimos 12 anos, e disso que ninguém tenha dúvidas, tem as qualidades necessárias para estar à frente do projeto. E, mais do que um treinador, é um gestor que faz a coordenação de todo o futebol do Seixal, coisa que até aqui nunca tivemos. Há momentos em que temos de ser pacientes, em que temos de apoiar. O trabalho vai acabar por dar resultados. E há uma coisa que devemos reconhecer no Rui, é um treinador corajoso.
— Portanto, não é um treinador a prazo?
— Todos os treinadores são treinadores a prazo, o último esteve seis anos no clube. O Rui tem capacidade para ficar aqui muitos anos. Vai deixar a sua marca no Benfica.
— Mas não fica preocupado com este início de época? A Supertaça perdida, dois jogos ganhos nos últimos 15/20 minutos, a derrota com o Arouca…?
— A equipa atual tem menos de dois meses de integração, muitos jovens, uma nova liderança, novos métodos de trabalho. Seria interessante ver como é que nos seis anos anteriores esteve a equipa antes da pausa de setembro.
— Dos três grandes, qual é o principal favorito a ganhar o campeonato?
— Creio que partimos os três em situação de igualdade. O Benfica vai defender o título, temos essa ambição; o FC Porto e o Sporting, pelo investimento feito, têm obrigatoriamente de lutar pelo título.
— Temos um Benfica que baixou drasticamente o investimento de anos anteriores, ao contrário do FC Porto, que, embora baixando, mantém o investimento num nível elevado, e do Sporting, que deixou a contenção dos últimos dois anos para investir com algum significado no plantel e no treinador. Não teme ser vítima desportiva da nova opção desportiva/financeira?
— É uma opção que dará frutos. Se não for no imediato, a médio prazo sairemos reforçados. Digo isto, mas acredito que mesmo desportivamente podemos ganhar no imediato. Quanto aos outros clubes fazem aquilo que entendem fazer e não me vou pronunciar.
GAITÁN, LIMA CARCELA, TAARABT
— O melhor reforço do Benfica chama-se Nico Gaitán?
— Diria que o melhor reforço do Benfica é todo o plantel. É evidente que o Nico é um jogador com um talento Único e que sempre esteve comprometido com a equipa. E isso é algo que vale a pena dizer. Com todas as notícias que houve ao longo de meses, o jogador sempre esteve comprometido com o Benfica, o que é justo destacar.
— Mas houve, ou não, ofertas?
— Vou responder de outra forma: não houve nenhuma oferta que fosse merecedora de levar o jogador para fora do Benfica.
— Esta dedicação do Gaitán merece um prémio?
— Os adeptos e os sócios vão dar-lhe esse prémio. Sei onde quer chegar com a pergunta, mas isso são assuntos que tratamos dentro de casa, e não nos jornais.
O projeto BTV não está em causa. Mas a centralização dos direitos TV pode alterar parâmetros. Como é que está o processo de centralização dos direitos televisivos, em estudo há algum tempo?
Era um projeto em que se estava a trabalhar com a direção da Liga. Neste momento, desconheço em que ponto é está. Não estamos contra o principio, pelo contrário, até acho que pode ser uma boa solução, desde que os critérios em relação à distribuição de verbas sejam justos e, fundamental, desde que sejam garantidos os princípios de uma livre concorrência entre os candidatos a ficar com esses direitos.
— Este processo não coloca em causa o projeto Benfica TV?
— Não, embora seja evidente que, se a centralização vier a avançar, a BTV terá de ter um enquadramento diferente daquele que tem hoje, mas não vale a pena falar do que será a BTV em função de um cenário que está longe de se concretizar.
— A abertura da BTV 3 é uma hipótese em estudo?
— É algo que estamos a equacionar.
— A Premier League vai continuar na BTV?
— É esse o nosso desejo.
— A mensalidade da BTV tem-se mantido nos 9,90 euros. É para continuar?
— Apesar de neste ano a BTV ter incorporado as ligas francesa e a italiana, vamos manter o valor.
— Era inevitável perder Lima?
— Seria injusto para um jogador que tanto deu ao Benfica não o deixar fazer o contrato da sua vida.
— Entre os que entraram, há dois avançados: Raúl Jiménez e Mitroglou. Num ano em que o Benfica gastou tão pouco em contratações, faz sentido investir nove milhões por metade do passe de um avançado?
— Faz, se tivermos as garantias de que é um jogador que nos vai trazer rendimento desportivo e de que nos pode dar, no futuro, retorno financeiro. Confesso que não foi uma decisão fácil, mas entendi que era um jogador que nos iria trazer uma mais-valia desportiva que justificava o investimento.
— E também houve duas apostas de risco e que ainda estão por provar: Carcela e Taarabt…
— São dois jogadores com muito potencial, e têm um desafio que não podem desperdiçar: provar o seu valor aqui. O Benfica não representa para eles mais uma oportunidade, representa a oportunidade. E tenho a certeza de que a vão agarrar.
— Entre os que saíram está Maxi Pereira. Como é que o Benfica perdeu Maxi Pereira para o FC Porto?
— O Benfica não perdeu Maxi Pereira. Ele é que não quis continuar aqui. Mas isso é um capítulo fechado. O jogador e o seu empresário escolheram outra equipa para continuar. Já não tenho a visão romântica do futebol, isso já lá vai. Não lhe desejo felicidades desportivas, obviamente, mas também não vou dizer mal do Maxi. Tomou a sua opção, e nós vamos seguir o nosso caminho.
— O Benfica fez tudo para continuar com o jogador?
— Sinceramente, creio que sim. E também acredito que não foi pela vontade do jogador que se deu a mudança. Mas antes quero falar dos que cá ficaram e dos que entraram no plantel do que de jogadores que não são nossos.
O PROCESSO DA SAÍDA DE JORGE JESUS
— Jesus saiu do Benfica, é hoje treinador do Sporting e, entretanto, muita coisa se disse e escreveu. Foi o Benfica que não quis JJ, ou foi JJ que não quis o Benfica?
— Disse bem, muita coisa se escreveu e disse que não tem nenhum fundamento, nem correspondência com a verdade, mas isso é passado. Seguimos por caminhos diferentes, e cada um do seu lado vai fazer o melhor na defesa dos seus interesses.
— Se voltasse atrás, teria feito tudo da mesma forma em relação ao processo Jorge Jesus? Fez tudo para o manter?
— Sinceramente, acho que fui muito honesto e muito sério com Jesus e com a sua família. Mas o meu treinador chama-se Rui Vitória. Interessa-me falar do presente e do futuro, não do passado.
— É inevitável o processo de saída de Jorge Jesus acabar em tribunal?
— Quando há diferendos entre as partes, os tribunais servem exatamente para isso, para decidir quem tem razão, e é isso que neste caso vai acontecer. Sem qualquer tipo de dramatismo… Dei instruções – em função do entendimento do nosso departamento jurídico – para defender os interesses do Benfica, e é isso que importa dizer.
— E depois disto… daqui para a frente: como é que vai ficar a relação Benfica-Jesus e a relação Luís Filipe Vieira-Jesus?
— Não me interessa a relação de A com B ou de B com C, o único que interessa aqui é o Benfica e a defesa dos interesses do Benfica.
— E relação Benfica-Sporting e Luís Filipe Vieira-Bruno de Carvalho?
— É ao nível da Liga, que é onde se deve falar e defender o futebol português.
AS ELEIÇÕES DA LIGA E PINTO DA COSTA
— Antes das últimas eleições na Liga, falou-se de uma aproximação Benfica-FC Porto…
— Falou-se de muita coisa. Numa altura em que o negócio do futebol esteve seriamente ameaçado, houve necessidade de convergir na procura de uma solução, de um nome que ajudasse a credibilizar a Liga e a trazer os patrocinadores de volta. Luís Duque foi esse nome, e houve, nessa medida, não diria uma aproximação, mas uma convergência na necessidade de salvar os campeonatos nacionais. Mas no capítulo desportivo, cada um por si. Como sempre foi e sempre será!
— Depois do processo eleitoral na Liga, está outra vez mais distante de Pinto da Costa?
— Não é uma questão de estar mais ou menos distante. Houve opções diferentes ao nível da Liga. Nada mais do que isso. Para bem de todos temos de ter uma Liga forte e credível. No meu entendimento, Luís Duque dava essas garantias. A opção foi outra, vamos trabalhar para que não se volte atrás no tempo…
— O Benfica apoiou Luís Duque e perdeu. Também foi uma derrota do Benfica?
— Não foi o Benfica que perdeu, foi uma derrota da coerência dos clubes da primeira e da segunda Liga, que 15 dias antes aprovaram um voto de louvor pelo trabalho desenvolvido por Luís Duque. É uma falta de gratidão enorme em relação a uma pessoa que devolveu a credibilidade à Liga.
— E que avaliação faz do trabalho de Pedro Proença até agora?
— Não se pode fazer a avaliação do trabalho de alguém que chegou há menos de um mês ao cargo.
— Os clubes deram passos atrás com esta mudança na Liga?
— Só tempo e a gestão do novo presidente poderão responder a essa pergunta. Sinceramente, espero que não.
Daqui a um ano há eleições e ainda não sabe se se recandidata. Não governa a pensar nisso…
FALTA pouco mais de um ano para as eleições no Benfica. Já pode revelar se vai recandidatar-se para mais um mandato?
— Um ano é muito tempo. Sinceramente, nem sequer pensei nisso. Portanto, não tenho ainda uma resposta.
— Acha que a conquista do titulo de campeão vai ser determinante na sua decisão de continuidade?
— Nunca o foi e não será também desta vez. Em todo o caso, este mandato deve ter sido um dos mandatos mais bem sucedidos do ponto de vista desportivo de qualquer presidente na história do Benfica. Mas não será isso que determinará a minha decisão.
— Em ano eleitoral, não considera arriscado optar pelo modelo da formação e do menor investimento no futebol?
— O caminho mais fácil seria continuar como até aqui, mas isso, sim, é que seria perigoso. As decisões não devem ser tomadas em função de haver ou não eleições. Fizemos uma escolha que privilegia o futuro, a independência e a sustentabilidade do Benfica, e é isso que importa.
— A um ano das eleições, como é que estão as contas do Benfica? Há um plano em marcha para reduzir o passivo? Quais são as metas?
— As contas estão equilibradas. Temos vindo a reduzir o passivo, mas não há uma meta fixa. Se tudo correr como acho que vai correr, vamos voltar a ter capitais próprios positivos.
— Já disse que consigo o Benfica não será vendido a um investidor externo; neste momento, é difícil o acesso ao crédito bancário. Perante a dificuldade na captação de investimento, como é que se consegue manter esta máquina a funcionar sem correr o risco de ela parar?
— Com inovação, com uma equipa muito dinâmica. Mais de 90% das propostas feitas pela nossa equipa de marketing são feitas para fora de Portugal. O patrocínio da Emirates foi trabalhado durante quase um ano e meio. Nada se consegue sem trabalho e sem bons profissionais. Felizmente, é algo que existe na nossa organização.
— O Benfica perdeu cerca de 100 mil associados de acordo com a última atualização de sócios. Consegue entender esta redução quando o Benfica fechou em 2014/2015 a época com mais finitos na sua história?
— Há sempre maneiras diferentes de olhar a mesma realidade. É verdade que se perderam quase 100 mil sócios, numa década terrível do ponto de vista das dificuldades económicas e em que as pessoas foram sujeitas a grandes sacrifícios. Mas também podemos ver isto de uma outra forma. Na última renumeração, em 2005, o Benfica tinha 95 mil sócios. Portanto, nós, nos últimos dez anos, crescemos e consolidámos mais de 50% em relação a 2005. Estou satisfeito? Claro que não, mas agora compete-nos voltar a crescer. E se na próxima renumeração voltarmos a crescer e a consolidar mais de 50%, então isso será uma excelente notícia.
É com satisfação que fala do sucesso das modalidades. O orgulho pelo projeto olímpico
OLHANDO ao futebol e às principais modalidades de pavilhão, o Benfica venceu cinco campeonatos em seis possíveis e fez quatro dobradinhas. A melhor época de sempre a nível desportivo…
— Foi sem dúvida um ano excecional, e só tenho pena de o andebol não nos ter acompanhado neste percurso, mas, tal como no hóquei levámos tempo a construir uma base sólida, no andebol vamos fazer o mesmo. Vamos lá chegar. Mas as pessoas, quando olham para o sucesso da época passada, têm de olhar para o trabalho dos últimos 14 anos. Chegámos aqui porque fizemos aquele percurso. A credibilização do clube, as infraestruturas criadas, a BTV, o museu, tudo isto foi importante para chegar aqui. Hoje ganhamos porque criámos condições para isso.
— Lembro-me de muitas vezes se ter ponderado acabar com esta ou aquela modalidade…
— Nunca defendi esse caminho, pelo contrário, sempre defendi que o ecletismo era uma das marcas do Benfica. As modalidades fazem parte do ADN do clube. Toda a reestruturação e aposta que fizemos no futebol de formação e profissional também fizemos nas nossas modalidades. Este trabalho nunca é um trabalho que dê frutos a curto prazo, é sempre um trabalho de paciência. Soubemos ter essa capacidade e agora estamos acolher os frutos. No atletismo, por exemplo, foi um trabalho praticamente iniciado do zero com a Professora Ana Oliveira. Foram anos a formar, a criar condições, a consolidar trabalho e agora o Benfica passou a ser a principal referência do atletismo português.
— Ainda recentemente o Nelson Évora ganhou o bronze em Pequim. Espera que os atletas do Benfica ganhem muitas medalhas no Rio de Janeiro?
— Ainda bem que falou do Nelson Évora, é totalmente justo destacar a medalha ganha nos mundiais de atletismo e é, naturalmente, um dos atletas de quem sinceramente espero possa trazer uma medalha para Portugal. E é curioso porque muita gente já não acreditava que ele pudesse voltar a este nível, mas o Benfica através do seu projeto olímpico sempre acreditou e sempre o apoiou, e quase que apostava que se não fosse este trabalho desenvolvido aqui, talvez o Nelson não tivesse voltado a ser o que é. E isso para mim é motivo de orgulho. Não devo andar longe da verdade se disser que o Benfica será o clube que mais atletas vai emprestar à nossa representação olímpica e que espero que alguns deles possam fazer ouvir o nosso hino no Rio.
— Isto é recado para alguém?
— O quê? A questão do Nelson ou o facto de sermos o clube que mais atletas vai levar ao Rio? Não é recado, são duas constatações. Vamos lá ver, com o projeto olímpico contribuímos – com gosto – para que a nossa representação olímpica seja a melhor a cada quatro anos. Só gostava que da parte das instituições públicas, fosse feito esse reconhecimento, em vez do discurso recorrente que hostiliza os clubes e os menoriza enquanto instituições que nada fazem pelo desporto português.
«Estou confiante e otimista, sim. Passei as últimas semanas no Seixal e sei que o plantel está motivado e vai dar tudo para conquistar o tri. Mas também sei que assumimos uma opção de mudança em relação ao que era a realidade do Benfica nas últimas décadas e essa mudança implica tempo e também algumas dores de crescimento normais nesse tipo de processo»