Os 13 pontos a que levaram o "caso" dos Vouchers a ser Arquivado
LIGA
PORTUGAL FUTEBOL COM TALENTO
PROCESSO DE INQUÉRITO 5. 6-15/16
Arquivamento do PI n.° 6-15/16, que tinha por objeto averiguar do eventual relevância, luz do ordenamento jus-disciplinor das competições profissionais de futebol, dos factos relatados pelo Sr. Presidente do Sporting Clube de Portugal – Futebol SAD na sua entrevista de 05/10/2015, assim como da possível carga ofensiva dos suas declarações (aquelas e as que se lhe seguiram em referência ao mesmo tema) em mesmas consideradas.
A fundamentação sintética é a seguinte:
1. No que tange à factualidade atinente às ofertas realizadas a árbitros, observadores e delegados da LPFP. por porte do Sport Lisboa e Benfica – Futebol, SAD, por ocasião dos jogos das competições profissionais em que a equipa principal e B daquele clube estiveram na condição de visitadas. impõe-se o enquadramento à luz do ordenamento regulamentar e jus-disciplinar.
2. Desde logo, as “Normas e Instruções para Árbitros – Futebol de Onze”, emanadas pelo Conselho de Arbitragem da FPF, contemplam no Ponto 5 [sob a epígrafe «Lembranças»], do seu Cap. III que «[o]s árbitros podem aceitar recordações sem valor comercial, tais como emblemas, galhardetes, miniaturas da camisola da equipa. medalhas comemorativas ou lembranças regionais, mas somente depois do jogo».
3. Por sua vez, o n.° 5 do art. 62.° do RD dispõe que «não cabem nas previsões dos números anteriores [condutas típicas de corrupção da equipa de arbitragem] as simples ofertas de objetos meramente simbólicos». Vale por dizer que a oferta de objetos meramente simbólicos, lembranças, se apresenta como regulamentarmente admissível. Não porque a natureza simbólica de tais ofertas seja excludente de uma qualquer ilicitude, mas por se trotar em si mesmo de uma conduta atípica.
4. Olhando para o regulamentação do UEFA, em concreto para os “General Terms and Conditions for referees officioting ot UEFA matches” [Edition 2014]. pode ler-se no seu ponto 6.2 que «os árbitros comprometem-se a não aceitar quaisquer ofertas com um valor superior a €300.00 (ou valor equivalente) de organismos e/ou pessoas, direta ou indiretamente relacionadas com os jogos da UEFA para os quais foram nomeados.
5. Quanto este normativo da UEFA, sobressai, como aliás resulta do próprio preâmbulo desse corpo normativo, que o mesmo tem o seu âmbito de aplicação objetivo restrito aos jogos organizados pelo UEFA e, no plano subjetivo, aos árbitros designados para esses jogos. lnexiste, portanto, qualquer norma no ordenamento jurídico das nossos competições profissionais que convoque a aplicação desse corpo narrativo, seja a título principal, supletivo ou subsidiário. Uma eventual aplicação do mesmo em termos de construção do tipo de ilícito sancionados de oferta violaria o princípio da legalidade [art. 9.° do RD]. na sua dupla vertente da tipicidade e da proibição de recurso à analogia.
6. Assim, antolham-se como admissíveis, à luz do recorte regulamentar vigente, as ofertas simbólicas [que valem por aquilo que representam] as lembranças [presente, dádiva, geralmente de pouco valor; objeto que vendido ou comprado para fazer lembrar algo ou alguém, geralmente um local], associados à cortesia social e, no caso, à cortesia desportiva.
7. No caso em apreço. uma caixa com a figura de Eusébio da Silva Ferreira, vulto do desporto em Portugal e da histórica do SL Benfica em particular, com uma réplica da camisola por si usada, ofertada aos agentes da arbitragem, de forma generalizada e indiferenciada, no final dos jogos em que aquela equipa assumia o condição de visitado, como recordação, não pode deixar de ser vista, na praxis futebolística, como tendo cariz de simbólica, de lembrança, sem outro valor que não o de poder figurar no memória de um agente desportivo (árbitro no caso), testemunhando o seu passado desportivo e aqueles com quem se relacionou.
8. Não se diga que tal raciocinio sai ofetado por na oferta entregue estar presente um convite/voucher (duplo ou para quatro Pessoas) permitindo acesso ao Museu do clube e outro espaço com possibilidade eventual de uma refeição, a qual – de acordo com os próprios elementos carreados pelo Sporting Clube de Portugal e depois pelo Sport Lisboa e Benfica – se cifraria no montante médio de €30,00 por refeição. Tal oferta continua a cair na cortesia social [não diferente da oferta de catering aos árbitros por ocasião dos jogos, de entrega de produtos gastronómicos ou outros regionais de menor ou maior valor comercial], cumprindo uma função de promoção comercial do clube junto daqueles que institucionalmente consigo se relacionam.
9. Ainda que se procurasse dar um valor máximo de mercado a esta oferta, sempre teríamos que: o Kit Eusébio poderá chegar ao valor de €59.90, a que acresce, caso fosse usado, o voucher para 4 refeições (30.00€/Paxt) – €120. num total de €179,90. Este constitui montante bastante inferior aos €300,00 indicados nas regras para árbitros nos jogos da UEFA (o valor de 200 francos suíços, referido nos autos pelo Sporting Clube de Portugal, foi alterado para 300 euros com a entrada em vigor do normativo da UEFA a partir de setembro de 2014), o que explica que nos jogos dessas competições o Sport Lisboa e Benfica entregue não só aquele “kit Eusébio” e os vouchers como alguns artigos adicionais, contendo-se ainda assim dentro do montante admitido.
10. Conclui-se, por estas várias razões, que a oferta sub judice ingressa no conceito de ofertas de mera cortesia, lembrança entregue por ocasião dos jogos (sempre no final dos mesmos e sempre na presença de delegados da LPFP) a todos os agentes de arbitragem e delegados da LPFP intervenientes, de modo generalizado e indiferenciado e admitida na regulação desportivo vigente.
11. Confrontando esta realidade com a factualidade típica prevista no ilícito de corrupção do equipa de arbitragem. presente no art.° 62.° do RD, acresce a verificação de que se não atribui relevância, no nosso ordenamento jurídico, uma qualquer oferta de vantagem (mesmo que superior àquele valor), mas apenas aos casos em que a oferta contribui para “solicitar o esses agentes (árbitros), expressa ou tacitamente, uma atuação parcial e atentatória do desenvolvimento regular de jogos integrados nos competições profissionais”.
12. Ora, de tal propósito de viciação do normal decurso dos jogos não se encontra, nos autos, qualquer vestígio – pelo contrário, todos os 142 agentes do arbitragem que se pronunciaram nos autos afirmam que nunca tal sucedeu.
13. Finalmente, no que respeita à eventual relevância disciplinar dos declarações feitas pelo Sr. Presidente do Spoting Clube de Portugal, na ótica do participação apresentada pelo Sport Lisboa e Benfica violadoras da honra dos visados e destinadas à coação de árbitros tendo em vista jogos futuros, também se não vislumbra que atinjam o patamar do dignidade disciplinar. É assim porque tais declarações assentam num facto principal que corresponde à verdade (a existência daquele “kit Eusébio” e a oferta de vouchers para o Museu Cosme Damião e o Museu do Cerveja), não tendo nunca sido afirmado que correspondiam o práticas de corrupção. Na entrevista dada ao jornal Expresso a 10.10.2015, o Sr. Presidente do Sporting Clube de Portugal disse que “se [ofertas do Benfica aos árbitros] acha que é corrupção? Não”. Assim sendo, aquelas declarações podem ser interpretadas como visando apenas o esclarecimento, pela justiça desportiva, da factualidade descrita – como, de resto, sucedeu.
Porto. 27.01.2016
A Comissão de Instrução e Inquéritos