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“Os jogadores têm sido altamente responsáveis, solidários e motivo de muito orgulho para todos”

São tempos nunca antes vividos, de adaptação e resiliência, onde todos somos colocados à prova! O Benfica está em casa há praticamente um mês, momento em que a COVID-19 foi declarada pandemia. O diretor-geral Tiago Pinto, em entrevista à BTV, revela pormenorizadamente como o Futebol Profissional vive o momento e explica os planos colocados em ação.

Definitivamente, este não é um momento fácil, mas é também nestas alturas, em que não existe outra alternativa senão sermos fortes, que conhecemos verdadeiramente a nossa força e demais capacidades. Os jogadores sentem a falta de “casa”, da Luz, de fazerem aquilo que mais gostam, e a estrutura do Campeão Nacional tem respondido à altura. “Este tem sido um desafio muito intenso“, mas a enorme cumplicidade que vinga entre todos tem tido sucesso, pois “há uma ligação emocional muito forte”.

Tiago Pinto vinca que “os jogadores têm sido altamente responsáveis, solidários e motivo de muito orgulho para todos“, e aponta ao grande objetivo, à meta para qual diariamente se trabalha de forma coordenada e transversal a todo o Departamento de Futebol…

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“A nossa grande preocupação diária é ter a certeza de que tudo se fez durante este período para, quando o futebol voltar, o Benfica estar mais capaz do que os outros e ganhar as 11 finais“, afirma de forma taxativa.

Tiago Pinto

Que balanço faz deste período de isolamento social em pleno estado de emergência? Como está o Futebol do Benfica neste momento insólito nas vidas de todos nós?

Temos seguido uma máxima que está antes de tudo o que fizemos a seguir, e que inclusive já foi referida por um jogador numa recente entrevista: nós não conseguimos definir quando vamos voltar, mas conseguimos definir a forma como vamos voltar. Este é um momento muito particular para todos nós, é um momento para o qual ninguém estava preparado, pelas particularidades que nos trouxe. De qualquer forma, nós, enquanto estrutura, tudo temos feito para conseguir durante este período cumprir com as normas da Direção-Geral da Saúde e, ao mesmo tempo, manter o Benfica ligado e preparado. Ouço muitas vezes dizer que nada será igual depois da COVID-19, mas eu acrescentaria, nada será igual depois da COVID-19, exceto a necessidade de o Benfica ganhar sempre e, por isso, nós temos de cumprir tudo aquilo que são as normas de saúde, mas ao mesmo tempo ter uma estrutura e uma equipa completamente ligadas para, quando chegar a hora de competir, estarmos a 100 por cento.

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“NÓS NÃO CONSEGUIMOS DEFINIR QUANDO VAMOS VOLTAR, MAS CONSEGUIMOS DEFINIR A FORMA COMO VAMOS VOLTAR”

Os jogadores estão de férias, é público. Porque é que o Benfica tomou essa decisão? Já há uma data marcada para o regresso?

Sim, é público. Jogámos o último jogo no dia 7 de março, entretanto, passou um mês e os jogadores estiveram em casa com planos de trabalho muito específicos, com uma monitorização muito apertada, com o envolvimento de toda a estrutura e toda a equipa técnica. Aliás, o dr. Ricardo Antunes, responsável pelo Departamento Médico, e o Alexandre Silva, adjunto da equipa, explicaram isso na BTV. Sentimos que, depois de ter sido definido pela Liga um plano de retoma que tem como início o dia 1 de maio, era necessário, neste período, nas próximas duas/três semanas de abril, aligeirar um pouco a carga e os planos individuais que os jogadores tinham. Aligeirar também a constante e intensa monitorização que todos os nossos departamentos e profissionais mantêm com os jogadores, face a algum desgaste emocional e alguma dificuldade em lidar com o facto de estarmos permanentemente em casa, e assim os jogadores pudessem também desfrutar um pouco mais das suas famílias, tentarem relaxar, mantendo os seus planos de manutenção, mas encontrando aqui um equilíbrio para que quando regressarmos estejamos todos a cem por cento.

Também é público que o Benfica permitiu que jogadores como Grimaldo (Espanha) e Weigl (Alemanha) viajassem para os seus países, por outro lado, o Benfica também ajudou a que as famílias se juntassem aos que ficaram em Portugal, que, no fundo, foram a maioria. Como é que se desencadeou este processo, isto num período de limitações na circulação e onde é tão difícil fazê-lo?

Este tem sido um desafio muito intenso para os jogadores e também para a estrutura. Conseguimos, numa primeira fase, graças ao nosso Departamento de Operações, duas coisas muito importantes. Equipar a casa dos jogadores com recursos, máquinas, utensílios para eles poderem treinar e minimizar ao máximo o facto de não se poderem deslocar ao Seixal, mas, paralelamente, quando percebemos o que ia acontecer, tentámos ter uma iniciativa de reagrupamento familiar. Percebemos onde é que isto ia parar e, como tal, dentro de cada situação particular do jogador, quem é que tinha e quem é que não tinha família, e tentámos ao máximo que ficassem próximos. Por isto mesmo, um mês depois, quando tomámos a decisão de dar alguma liberdade aos jogadores, só dois é que acabaram mesmo por ter de sair do País, e são duas situações que aconteceram porque, precisamente na família de ambos, houve acontecimentos importantes para os quais era importante e relevante a sua presença. Nós, com toda a segurança, cumprindo todos os requisitos legais, conseguimos que o Julien voltasse à Alemanha e o Grimaldo a Espanha.

Tiago Pinto

“TEMOS UMA ESTRUTURA E UMA EQUIPA COMPLETAMENTE LIGADAS PARA QUANDO CHEGAR A HORA DE COMPETIR ESTARMOS A CEM POR CENTO”

Jogadores, equipa técnica, todo o staff do Benfica mantêm contacto, quer agora, quer anteriormente, quando ainda não estavam em férias?

Aqui há duas vertentes! Numa vertente profissional, do ponto de vista do LAB são desenhados todos os planos de treino individuais, em devida articulação com a equipa técnica. As pessoas do LAB fazem uma monitorização diária daquilo que é o treino dos jogadores. O nutricionista é depois responsável por, em conjunto com as operações, deixar as refeições em casa dos jogadores todos os dias; a própria psicóloga acompanha os jogadores; o departamento médico, diariamente, tem que contactar com os jogadores para saber se está tudo bem, se precisam de alguns cuidados… Nós, apesar de todas estas restrições, se sentimos que algum jogador tem alguma limitação ou problema, temos de lhe acorrer. Por isso, do ponto vista profissional essa ligação é obrigatória todos os dias. Não dá para ser de outra maneira, numa equipa com esta importância.

(…)

Tem sido muito visível o envolvimento dos jogadores do Benfica do ponto de vista social. Todas as campanhas que o Benfica tem feito de solidariedade, de responsabilidade social, de apelo para as pessoas ficarem em casa, tudo isso demonstra essa ligação dos jogadores à estrutura e à causa social. Do ponto de vista profissional existe essa necessidade de estarmos em contacto permanente e diário, mas depois, felizmente, e isso tem sido público também, há uma ligação emocional muito forte entre jogadores, staff e equipa técnica e, através das tecnologias, todos os dias estamos em contacto… Isto é mesmo uma família e, como qualquer família, quando passa dificuldades temos também a tendência para procurarmos estar mais juntos. Aqui não é possível estarmos fisicamente, mas tenho a certeza absoluta, e é facilmente comprovável, que todos os dias estamos todos em contacto, e isso é também uma forma de nos mantermos ligados para o que aí vem!

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Como é que estão os jogadores?

Os jogadores do Benfica estão muito comprometidos com a causa social. Apesar de sabermos que vivemos num ambiente muito protegido (os próprios jogadores vivem num ambiente muito protegido durante todo o ano), eles foram os primeiros a ter noção da gravidade do problema e a ter a perceção que aquilo que fazem e que dizem pode ser importante para mobilizar a sociedade. Nesse sentido, têm sido altamente responsáveis, solidários e motivo de muito orgulho para todos nós, inclusive o Presidente já o referiu publicamente. Depois, vem a grande dificuldade! Todos nós, quando éramos mais novos, sonhávamos ser jogadores de futebol por tudo aquilo que tem de bom ser jogador de futebol. Um jogador de futebol está habituado a estar 30 dias sem folgas, 30 ou 40 dias sempre em atividade… Não está habituado a estar 30 dias em casa, não está habituado a não poder vir treinar. Não está habituado a não sentir a relva, tocar na bola e estar com os colegas! A generalidade das pessoas dirá que eles têm vidas muito privilegiadas, e todos nós no futebol sentimos isso, que somos protegidos, mas a verdade é que, para os jogadores, tem sido uma dificuldade muito grande não poder treinar, não poder estar com os colegas, jogar. Temos de ter consciência disso e arranjar formas de mitigar estes efeitos. Claramente, esta tem sido a maior dificuldade! Um jogador do Benfica, aquilo de que realmente gosta é de estar a competir de três em três dias, de quatro em quatro dias, e agora estamos há mais de um mês limitados nesse aspeto. Essa é mesmo a grande dificuldade.

Qual tem sido o papel desta equipa chefiada por Bruno Lage?

A equipa técnica tem acompanhado todo o processo, todas as tarefas e atividades que temos, e todas as decisões que tomamos são sempre em sintonia com a equipa técnica, principalmente com o míster Bruno Lage, que, por sua vez, também tem uma relação com o staff e com os jogadores. A monitorização e o acompanhamento são feito por eles também. Falando única e exclusivamente do trabalho da equipa técnica, o míster Bruno Lage não dá descanso a ninguém e muito menos aos elementos da equipa técnica, que têm passado este tempo a refletir sobre aquilo que foi o passado, a fazer muita análise de jogo e de treino e a perspetivar aquilo que será o futuro, os jogos que vêm por aí, aproveitando os departamentos de Análise e Observação e o departamento de Scouting. Quando jogamos de três em três ou de quatro em quatro dias, temos pouco tempo para refletir, e este é um momento de reclusão e de todos nós refletirmos sobre aquilo que fazemos e sobre o que queremos para o futuro. Nesse aspeto, a equipa técnica do Benfica tem estado a 1000 por cento, ou a “1000 à hora” como é usual o Bruno Lage dizer.

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“O NOSSO FOCO É NO FINAL DE ABRIL/INÍCIO DE MAIO REGRESSAR AO TRABALHO, AINDA QUE COM MUITAS LIMITAÇÕES”

Neste momento, há um debate em aberto com duas perspetivas completamente diferentes: por um lado, há quem defenda que as competições devem ser imediatamente canceladas; por outro, há quem defenda que os campeonatos devem ser concluídos, seja quando for. Qual é a posição do Benfica?

Eu, como diretor-geral, tenho de estar conhecedor de todas as posições. Por isso, temos participado em todas as reuniões – sejam da FPF, da Liga, da ECA, ou de todos os fóruns oficiais – e sabemos o que se passa em Portugal e nos outros países e instituições. Sabemos das várias teorias e perspetivas, mas eu acho que é importante voltarmos um pouco ao início e citarmos o nosso Presidente, quando ele dizia que isto não era tempo para pensarmos em futebol, mas sim na questão da saúde. Há aqui uma coisa que não vai mudar: quem vai ditar a velocidade a que o futebol anda são as normas, é a DGS, é o Ministério da Saúde. Da nossa parte, hoje em dia, o discurso oficial que existe, na UEFA, na ECA ou na Liga portuguesa, é: os campeonatos vão concluir-se. Obviamente, aquilo que mais queremos é voltar a jogar. Sabemos que o temos de fazer em situações de segurança para todos, mas queremos muito voltar a competir e concluir as 10 jornadas – mais a final da Taça de Portugal – que nos faltam para terminar a época. Resumindo, eu diria que, neste momento, o nosso único foco é garantir que no início de maio conseguimos voltar a treinar, embora com algumas limitações, e, o mais tardar, em junho, iniciamos a competição, que são as indicações que temos da Liga. Depois teremos até ao final de julho/início de agosto para concluir as competições.

É esse o plano do Benfica, em função do que está determinado pela Liga ou pela UEFA?

A Liga portuguesa tem seguido ipsis verbis as determinações que vêm da UEFA. A última grande determinação foi alargar o prazo até dia 3 de agosto para podermos concluir as competições nacionais. Infelizmente, não temos equipas portuguesas nas competições europeias, o que, por outro lado, acaba por dar maior possibilidade de se concluir as competições nacionais. Nesse sentido, os clubes, em conjunto com a Liga e com os departamentos médicos de todos os clubes, começou a construir um plano de retoma que prevê o início dos treinos – ainda que individuais – no início de maio, que depois, mediante as determinações de saúde, passarão a treinos coletivos e, quando estiverem reunidas as condições possíveis, o início dos jogos, ainda que à porta fechada numa primeira fase. É neste panorama que temos de nos orientar, é aqui que está o nosso foco, as decisões que tomamos são em função deste plano. Obviamente que se me perguntarem se pensamos e estudamos outros planos, a resposta é “sim”. É o nosso trabalho. Mas, neste momento, o nosso foco é no final de abril/início de maio conseguirmos regressar ao trabalho, ainda que com muitas limitações.

É ou não verdade a hipótese que veio a público na Imprensa de que os jogos vão ser à porta fechada, e que inclusive o Benfica pode integrar o grupo de equipas que vão estar no Algarve praticamente em isolamento para concluir as provas?

Nunca ouvi esse tema nos fóruns próprios para estas discussões. Só na Comissão Permanente da Liga temos reuniões de três em três dias, e esse é um tema que nunca foi abordado e não me parece minimamente exequível.

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“QUANDO VOLTARMOS À ATIVIDADE, SERÁ NUMA SITUAÇÃO ALTAMENTE PROTEGIDA E CONTROLADA, ONDE OS TESTES SERÃO PRÁTICA CONSTANTE”

Se aparecer um caso positivo no staff de uma qualquer equipa, é ou não verdade que a prova tem de parar imediatamente?

Dentro desse plano de retoma que estamos a construir, e que numa primeira fase foi chamado de “otimista”, hoje em dia já está mais aproximado da realidade, porque a primeira premissa desse documento é que este plano só se aplica quando a DGS der autorização para começarmos os treinos. Dentro desse plano, onde participam todos os médicos dos departamentos dos clubes, uma das questão será essa de COVID positivo. No início de todo este processo, quando tomámos a decisão de parar o Campeonato, para nós era claro que, se houvesse um teste positivo, o Campeonato teria de parar imediatamente por razões de equidade entre as equipas. Mas sabemos que todos os dias a informação acerca do vírus, do comportamento do vírus e da sociedade perante o vírus vai mudando. Por isso, convidámos para esse grupo dois especialistas em epidemiologia e pneumologia que vão rever esse plano e que seguramente nos vão dar indicações mais precisas e mais claras de como devemos reagir perante testes positivos que podem acontecer. Há uma coisa que é garantida: nós, quando voltarmos à atividade, voltaremos numa situação altamente protegida e altamente controlada, onde os testes serão uma prática constante, onde o isolamento das equipas em contexto de estágio será uma obrigatoriedade.

Se lhe perguntar qual é a sua convicção, apesar da incerteza que estamos a viver, em relação ao regresso dos campeonatos, o que pode dizer?

A minha convicção é que será sempre, numa primeira fase, diferente do que estamos habituados, porque é assumido que serão jogos à porta fechada. Temos de ter alguma prudência, frieza e racionalidade, porque somos bombardeados com informação e notícias, que seguem rumos diferentes. O importante é ter frieza e racionalidade, irmos avaliando o que vai acontecendo para tomarmos as decisões certas. Não tenho dúvidas de que o futebol quer voltar a jogar, mas também não tenho dúvidas de que o futebol não voltará a jogar se isso não for bom para o futebol e para a sociedade. Sabemos a importância que o futebol tem para o povo português, mas se as autoridades de saúde e nós sentirmos que, em vez de estarmos a ajudar o povo português a sair da crise, estaremos a prejudicar, ninguém vai querer complicar.

O Benfica não se debate com este problema, mas há clubes que têm jogadores que terminam contrato a 30 de junho e a prova pode estender-se para lá dessa data. Será fácil ultrapassar esta limitação contratual?

Esta semana saiu um documento orientador da FIFA que traz alguma luz sobre esse tema. Deixa recomendações claras para que os contratos e janelas de mercado se adaptem às novas temporadas, isto é, se a temporada se estende um mês, os contratos devem estender-se um mês.

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“TEMO-NOS ENVOLVIDO NAS SITUAÇÕES A BEM DO FUTEBOL E ESTE É UM PROBLEMA SÉRIO”

O Benfica não tem nenhum caso desses…

Felizmente o Benfica não tem casos destes. Mas sabemos que os contratos… – e eu não sou um especialista jurídico – nada se sobrepõe à relação entre os jogadores e os clubes, mas, havendo estas normas e determinações da UEFA e da FIFA, acabará por facilitar. Dizer que, na reunião de presidentes, houve uma decisão que vai facilitar esta situação de jogadores que têm ações hostis contra os clubes, porque não serão contratados por outros clubes, e isso demonstra o espírito positivo com que se tem construído as coisas. Em último ponto, o Benfica não tem nenhum jogador nesta situação. Temo-nos envolvido nas situações a bem do futebol e este é um problema sério. No que nos diz respeito, durante esta época renovámos com muitos jogadores e não estamos expostos a este tipo de situações.

Um reforço como Pedrinho, se a temporada se estender para julho – e ele tem contrato a começar a 1 de julho –, pode jogar?

Não! O documento da FIFA é também claro nesse aspeto. Se as épocas colidirem, temos de dar o benefício ao clube anterior. E nós, para além das questões legais, temos a ética. Acreditamos e queremos muito o Pedrinho, mas na época 2020/21, porque a época 2019/20 será concluída com os 25 jogadores que fazem parte do plantel e que nos ajudarão a conquistar os dois títulos que ainda temos para disputar.

Tem feito parte das reuniões regulares da Liga por videoconferência. Qual é a avaliação que faz em relação ao posicionamento da Liga Portugal, de Pedro Proença e de vários agentes interessados no futebol português?

O que tenho sentido é uma vontade muito grande para estarmos unidos, para sensibilizar todos de que é mais o que nos une do que o que nos separa…

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Sente que há mais união, até entre os rivais?

Às vezes, o Ser Humano precisa de estar em situações limite para acorrer aos sentimentos mais positivos como a solidariedade e a união. O que sinto é que a Liga e a Federação [Portuguesa de Futebol] têm fomentado a união e a coesão entre os clubes. Apesar de não ser de agora – enquanto estruturas profissionais, entendemo-nos e colaboramos –, o que se sente nessas reuniões é uma vontade coletiva de que as coisas corram bem, para que possamos ajudar a que o País supere este problema e que o futebol volte em condições seguras, que possamos ser um exemplo para a sociedade e contribuirmos para resolver o problema.

Se os campeonatos não forem concluídos, e estamos a falar da Primeira Liga, quem é que deve ser o campeão, caso não seja possível concluir a época?

Neste momento, o nosso foco é garantir que, depois da COVID-19, o Benfica tem todas as condições para ser uma equipa vencedora. Temos 11 jogos para jogar, as indicações oficiais que temos é que vamos jogar esses 11 jogos e temos de garantir que a nossa equipa terá condições perfeitas para competir e vencer esses 11 jogos. Os campeões encontram-se dentro de campo, e para haver campeão tem de haver jogos, e é nisso que estamos focados. Se, por infortúnio, outros cenários se colocarem, cá estaremos para ponderar. Temos poucas dúvidas de que os campeões se atribuem dentro de campo.

Tiago Pinto

“OS CAMPEÕES ENCONTRAM-SE DENTRO DE CAMPO E PARA HAVER CAMPEÃO TEM DE HAVER JOGOS”

Neste momento há uma leitura óbvia: enquanto os campeonatos estão suspensos, os clubes têm custos e não têm receitas. Há vários planos de contingência, layoff e redução de salários. O Benfica vai avançar com cortes dos salários dos jogadores? Isso está a ser negociado?

O Benfica tem um líder que conhece o Clube como a palma das mãos, que passou por fases muito diferentes. O Clube soube lidar com as adversidades e hoje em dia é uma marca e uma equipa desportivamente forte. Neste momento, o Presidente [Luís Filipe Vieira] e o dr. Domingos Soares de Oliveira, com o conhecimento que têm do Clube, e com um ciclo restrito de pessoas, estão a analisar tudo, nomeadamente o impacto nas receitas, as despesas que continuaremos a ter, o comportamento do Clube e do mercado do futebol, caso estejamos vários meses parados em função do vírus. Sabemos o que está a acontecer na Europa. O que tenho a certeza é que o que vem nos jornais não tem nada a ver com a realidade. Essas duas pessoas [Luís Filipe Vieira e Domingos Soares de Oliveira] debatem tudo internamente, e se tiverem de falar com os jogadores, será falado com eles e não nos jornais ou através de intermediários.

Esta crise anunciada e já vivenciada poderá ter impacto na estratégia de contratações do Benfica na preparação da próxima temporada?

É inevitável que possamos abordar o próximo mercado influenciados por aquilo que vai acontecer. Não pode ser de outra maneira. Estamos a ver o mundo a mudar, a sentir o impacto que tudo isto tem na economia e sabemos também estamos dentro do ecossistema. Tudo vai ser diferente depois desta crise. Agora, este não é o momento para falar no mercado. Surpreende-me, porque é completamente fora de tom, haver jornais que sistematicamente falam de mercado, de jogadores, contratações, saídas, entradas… Posso garantir a todos os Benfiquistas que não temos – nem eu, nem o Presidente, nem o Rui Costa – qualquer dossiê de mercado. Essa não é a nossa preocupação! Agora estamos preocupados em garantir que a equipa tem as condições perfeitas para, quando regressar, estar a 100 por cento. Em conjunto com o Presidente, com o dr. Domingos e com toda a estrutura do Benfica, garantir que a estabilidade no Clube vai continuar. Depois competir e vencer, e a seguir teremos tempo para tratar do mercado.

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Notícias sobre o regresso de jogadores emprestados que podem voltar ou de haver mais jogadores da Formação a abastecer a equipa principal são falsas questões neste momento, ou estão já equacionadas, independentemente do cenário?

São dois temas que nada têm que ver com a pandemia. Esta época foi das melhores do ponto de vista do trabalho com os emprestados. Com a reestruturação que fizemos no departamento de scouting, garantimos que uma das missões de um dos scouts é acompanhar exaustivamente todos os jogadores emprestados. Mensalmente, Presidente, Rui Costa, Tiago Pinto e equipa técnica recebem relatórios minuciosos de tudo o que fazem os emprestados. Toda a nossa estrutura (as operações, eu enquanto diretor, a comunicação…) tem um contacto regular com os emprestados, para eles sentirem que não deixaram de fazer parte do Benfica, mas também para que, no dia em que um deles tiver de regressar, sentir que nunca saiu do Benfica. Isto não tem nada  ver com o vírus. O Benfica está cada vez mais a tentar que este acompanhamento seja sistemático. Independentemente do vírus, este trabalho é para continuar, podendo regressar um, dois ou três, ou nenhum, nesta época, isso logo se verá. Se há tema que é anterior ao vírus e se vai manter é a aposta delineada pelo Presidente na Formação. Hoje em dia temos 25 jogadores no plantel principal, oito vêm da Formação. Depois do vírus, esta política não vai mudar. Fazemos as coisas de forma cautelosa. Sabemos que a equipa não vai ser única e exclusivamente constituída por jogadores da Formação, mas também sabemos e conhecemos profundamente o que está na Equipa B, nos Sub-23, nos Sub-19… É nossa missão, sempre, olharmos para o planeamento desportivo com a noção de que da Formação vem a nossa principal fonte de talento. O vírus não mudará muito a necessidade extrema de acompanhar bem os emprestados do Benfica e a necessidade imperativa de acompanhar tudo o que se passa na Formação, porque é dali que sai grande parte do nosso talento.

Tiago Pinto

“SE HÁ TEMA ANTERIOR AO VÍRUS QUE SE VAI MANTER É A APOSTA DELINEADA PELO PRESIDENTE NA FORMAÇÃO”

Independentemente da crise pandémica com que nos confrontamos, a próxima época já estava desenhada, é isso?

A preparação das épocas vai-se fazendo durante o ano todo. Quando chegamos a janeiro e contratamos Julian Weigl e Dyego Sousa não estamos a pensar em apenas quatro meses. Essas contratações fazem parte de um plano desportivo, de um plantel que almejamos ter, de um plantel em que, em conjunto com o treinador, são identificados pontos de melhoria que queremos trabalhar, e isso é feito em contínuo. O mercado será totalmente diferente, mas há dois pontos que são sempre muito importante para nós: o acompanhamento dos emprestados, para perceber se um jogador pode voltar para acrescentar mais-valia, e o talento que há no Benfica Campus e que, todos os anos, queremos aproveitar e potencializar.

Pegando em dois exemplos do Benfica para fazer a pergunta: a curto prazo, já na próxima janela de transferências, será possível voltar a ter vendas como a de João Félix, acima dos 100 milhões de euros, ou compras na ordem dos 20 milhões de euros, como aconteceu em janeiro com Julian Weigl?

No imediato, o mercado do futebol vai ser muito afetado. A economia mundial está a ser profundamente afetada, e nós sabemos que o futebol é uma atividade que está dentro da área do entretenimento, e por isso na cadeia alimentar, digamos assim, é das últimas. Sabemos que vamos sentir na pele esses efeitos. No imediato, nas próximas janelas de mercado vai haver um efeito de retração em relação a esses valores. De qualquer forma, não sou daqueles que dizem que o futebol vai mudar completamente e nunca mais vamos ver transferências como a do João Félix por 126 milhões, como a do Philippe Coutinho por 150 milhões ou do Neymar acima dos 200 milhões. Não tenho tantas certezas sobre isso, porque, quando o mundo voltar à normalidade, muitos milhões de pessoas vão acorrer aos estádios, centenas de milhões de pessoas vão subscrever canais de televisão para ver o futebol. No futuro, podendo ser diferente, não acredito que daqui a algum tempo não se volte a apagar esses valores, mas tenho muitas dúvidas que aconteça no imediato.

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“TER A GARANTIA DE QUE, QUANDO O FUTEBOL VOLTAR, O BENFICA VAI ESTAR FORTE E CAPAZ DE GANHAR AS 11 FINAIS”

O diretor desportivo da Juventus avançou com a tese de que os clubes vão tendencialmente fazer mais trocas entre eles do que transferências. É um bom caminho? O Benfica também poderá ir por aí?

Trocar jogadores é um modelo de negócio como os outros. Menos explorado, mas é um modelo de negócio como os outros. É normal que o Fabio [Paratici] tenha dito isso, porque em Itália é uma prática comum, inclusive entre os clubes grandes. Também vejo muitas vezes as pessoas recorrerem à NBA para darem esse exemplo das trocas. Mas temos de perceber as realidades desportivas no seu contexto. Comparar a NBA com o futebol é difícil, porque são realidades desportivas completamente diferentes. E comparar o Calcio connosco também é difícil, porque voltamos a ter duas realidades diferentes. Cada vez mais vai ser importante explorar até ao limite todas as possibilidades de negócio que vão existir. Mais uma vez, se me disserem que a partir de agora os clubes vão só trocar jogadores e não vão emprestar, não vão comprar e não vão vender, eu não acredito.

Estamos com muitas saudades do futebol. Os Benfiquistas perguntam quando é que podem ir ver um jogo ao Estádio da Luz, sentir aquela atmosfera única, mas esta é uma questão ainda sem resposta. O que é que pode transmitir aos adeptos nesta altura?

Posso-lhes dizer duas coisas: desde cedo nós, aqui dentro, percebemos que, por mais que o mundo mude, depois disto o Benfica vai ter a necessidade de continuar ganhar, e o que posso prometer aos Benfiquistas é que nós não paramos, não descansamos, porque, face a estas limitações todas, temos de ter a garantia de que, quando o futebol voltar, o Benfica vai estar bem, forte e capaz de ganhar as 11 finais que tem pela frente. Essa é a nossa grande preocupação diária: quando o futebol voltar, o Benfica ter a certeza de que tudo fez durante este período para estar mais capaz do que os outros, para conseguir vencer os 11 jogos e conquistar os dois títulos que nos faltam.

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